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Após vários meses de rumores e especulações, o Poder Executivo apresentou no último dia 18/03/2025 o texto do Projeto de Lei com mais uma etapa da “reforma” do Imposto de Renda, dessa vez com o objetivo anunciado de ampliar a faixa de isenção do IR das pessoas físicas para aqueles contribuintes que ganham até R$ 5.000,00/mês.
O Projeto de Lei em questão (protocolado na Câmara dos Deputados como PL nº 1.087/2025) cria ainda, como mecanismo de compensação da perda de arrecadação causada pelo reajuste da faixa de isenção, o Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo (“IRPFM”), incidente sobre os chamados indivíduos de alta renda, assim considerados aqueles que ganham rendimentos acima de R$ 600.000,00 por ano (ou R$ 50.000,00/mês), além de instituir tributação sobre os dividendos pagos por empresas brasileiras a residentes no exterior.
Caso aprovadas, as mudanças na legislação ora propostas produzirão efeitos para os fatos geradores ocorridos a partir de 01/01/2026.
Abaixo, faremos uma análise ponto a ponto dos principais tópicos trazidos pelo PL nº 1.087/2025, bem como alguns comentários que julgamos pertinentes.
1. Ampliação da Faixa de Isenção do IRPF – Rendas Até R$ 5.000,00/mês
Em linha com promessas feitas ainda durante a campanha presidencial de 2022, o PL nº 1.087/2025 ampliou a isenção do IRPF para as pessoas físicas que ganham até R$ 5.000,00 mensais.
Além disso, para pessoas físicas que ganham entre R$ 5.000,00 e R$ 7.000,00 mensais, foi criado um redutor do IRPF, proporcional ao montante dos rendimentos. Já os contribuintes que recebem rendimentos acima de R$ 7.000,00 mensais permanecerão sujeitos à tributação atualmente vigente, por meio da tabela progressiva do IRPF.
Acerca desse ponto, vale destacar que o PL nº 1.087/2025 não previu a atualização da tabela progressiva atualmente vigente, tendo criado um mecanismo de redução do IRPF devido para que os rendimentos de até R$ 5.000,00 mensais não paguem o imposto.
2. Tributação das Altas Rendas – Criação do IRPFM – Base Mensal e Anual
Como alegada “medida de compensação” pela desoneração de grande parte dos contribuintes com a medida de ampliação da isenção, o PL propõe também a criação do mecanismo denominado Imposto de Renda da Pessoa Física Mínimo – IRPFM.
Assim, caso aprovado, a partir de 01/01/2026, os pagamentos, creditamentos, utilização ou entrega de lucros ou dividendos feitos a cada mês por uma mesma entidade (pessoa jurídica) a uma mesma pessoa física residente no Brasil, em montante superior a R$ 50.000,00, ficará sujeita à retenção na fonte pelo IRPFM, com aplicação de uma alíquota de 10% sobre o montante total pago, creditado, empregado ou entregue, sem quaisquer deduções ou descontos.
O IRPFM também incidirá sobre a totalidade dos rendimentos das pessoas físicas, quando estes forem superiores a R$ 600.000,00/ano, por meio da Declaração de Ajuste Anual do IRPF.
Para fins de incidência do IRPFM anual, serão considerados todos os rendimentos recebidos no ano-calendário, inclusive os tributados de forma exclusiva ou definitiva e os isentos ou sujeitos à alíquota zero ou reduzida, com exceção dos seguintes rendimentos:
- Ganhos de capital (exceto os decorrentes de operações realizadas em bolsa ou no mercado de balcão organizado sujeitas à tributação com base no ganho líquido no Brasil);
- Rendimentos recebidos acumuladamente (RRA) tributados exclusivamente na fonte, na forma prevista na legislação específica, desde que o contribuinte não tenha optado por sua tributação na Declaração de Ajuste Anual;
- Valores recebidos por doação em antecipação de legítima ou herança.
A base de cálculo do IRPFM, por seu turno, corresponderá ao valor dos rendimentos apurado acima, deduzindo-se:
- Rendimentos auferidos em cadernetas de poupança;
- Valores recebidos a título de indenização por acidente de trabalho ou por danos materiais ou morais (ressalvados os lucros cessantes);
- Rendimentos isentos decorrentes de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço, aqueles percebidos por portadores de moléstia profissional e moléstias graves, assim definida na legislação vigente, bem como valores recebidos a título de pensão quando o beneficiário desse rendimento for portador das doenças previstas na legislação vigente, exceto as decorrentes de moléstia profissional;
- Rendimentos de títulos e valores mobiliários isentos ou sujeitos à alíquota zero do IR, exceto os rendimentos de ações e demais participações societárias.
A alíquota máxima do IRPFM será de 10%, sendo aplicável neste patamar aos indivíduos que apresentem rendimentos anuais superiores a R$ 1.200.000,00.
Para os rendimentos anuais na faixa entre R$ 600.000,00 e R$ 1.200.000,00, será aplicado um fator de redução à alíquota máxima do IRPFM, de forma que esta seja diretamente proporcional ao montante da renda auferida, conforme a seguinte fórmula:
Alíquota do IRPFM % = (Total dos Rendimentos/60.000) -10.
O IRPFM devido, por seu turno, será calculado com base na multiplicação da alíquota pela base de cálculo, na forma definida anteriormente, com as seguintes deduções:
- Valor do IR devido na Declaração de Ajuste Anual (p.ex., pró-labore, salários e outros rendimentos sujeitos à tabela progressiva);
- Valor do IR retido exclusivamente na fonte, incidente sobre os rendimentos incluídos na base de cálculo do IRPFM (p.ex., aplicações financeiras sujeitas ao IR);
- Valor do IR pago sobre os rendimentos de aplicações financeiras do exterior e sobre os lucros auferidos de entidades offshore controladas;
- Valor do IR pago definitivamente referente aos rendimentos computados na base de cálculo do IRFM e não considerado nas hipóteses acima; e
- Eventual redutor a ser apurado, caso se verifique que a soma da alíquota efetiva das pessoas jurídicas distribuidoras de lucros e dividendos com a alíquota efetiva do IRPFM ultrapasse a soma das alíquotas nominais do IRPJ e da CSLL daquelas entidades, conforme o tópico seguinte.
Caso o valor apurado com base no disposto acima seja negativo, não haverá pagamento do IRPFM.
Por outro lado, se for apurado um valor a pagar, o IRPFM que eventualmente tenha sido antecipado mensalmente deverá ser compensado; feita a compensação, caso haja algum valor a ser restituído ou pago a título do IRPFM, o mesmo deverá ser informado na Declaração de Ajuste Anual como saldo a pagar ou restituir, conforme o caso.
2.1. Tributação dos Dividendos – Beneficiários Pessoas Físicas Residentes no Brasil – Redutor do IRPFM
O PL nº 1.087/2025 prevê um mecanismo que funciona como redutor do IRPFM, especificamente no caso dos lucros ou dividendos recebidos que componham a renda total sobre a qual incide o imposto.
Com efeito, a proposta determina que, caso se verifique que a soma das alíquotas efetivas de tributação dos lucros da pessoa jurídica com a alíquota efetiva do IRPFM aplicável à pessoa física beneficiária ultrapasse a soma das alíquotas nominais do IRPJ e da CSLL, será aplicado redutor ao IRPFM calculado sobre os referidos lucros e dividendos de cada pessoa jurídica às pessoas físicas sujeitas ao pagamento do IRPFM.
A soma das alíquotas nominais a serem consideradas para fins desse limite são as seguintes:
- 34% para as pessoas jurídicas em geral;
- 40% para as pessoas jurídicas de seguros privados, de capitalização, distribuidoras de valores mobiliários, corretoras de câmbio e de valores mobiliários, sociedades de crédito, financiamento e investimentos, sociedades de crédito imobiliário, administradoras de cartões de crédito, sociedades de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito e associações de poupança e empréstimo;
- 45% no caso de pagamento de lucros e dividendos por bancos de qualquer espécie.
O valor do redutor corresponderá ao resultado obtido por meio da seguinte fórmula:
Lucros ou Dividendos Recebidos x [(Alíquota Efetiva PJ + Alíquota Efetiva IRPFM) -Alíquota Nominal PJ]
Onde:
- Alíquota efetiva PJ: é a razão observada entre (a) o valor devido do IRPJ e da CSLL da pessoa jurídica e (b) o seu lucro contábil;
- Alíquota efetiva IRPFM: é a razão entre (a) o acréscimo do valor devido do IRPFM, antes da redução, resultante da inclusão dos lucros e dividendos na base do IRPFM e (b) o montante de lucros e dividendos recebidos pela pessoa física no ano-calendário; e
- Lucro contábil: é o resultado do exercício da pessoa jurídica antes dos tributos sobre a renda e das respectivas provisões.
A legislação proposta prevê ainda que a concessão do redutor será condicionada à apresentação de demonstrações financeiras da pessoa jurídica, elaboradas de acordo com a legislação societária e com as normas contábeis em vigor, na forma que vier a ser estabelecida em regulamento.
Adicionalmente, foi também estabelecido que, na forma que vier a ser regulamentada, o cálculo da alíquota efetiva e do imposto devido pela pessoa jurídica poderá ser realizado com base nas demonstrações financeiras consolidadas da fonte pagadora.
No caso específico de empresas não sujeitas ao Lucro Real, poderá haver a opção por cálculo simplificado do lucro contábil, o qual corresponderá ao valor do faturamento com a dedução das seguintes despesas:
- Folha de salários, remuneração de administradores e gerentes e respectivos encargos legais;
- Preço de aquisição de mercadorias destinadas à venda, no caso de atividade comercial;
- matéria-prima agregada ao produto industrializado e material de embalagem, no caso de atividade industrial;
- Aluguéis de imóveis necessários à operação da empresa, desde que tenha havido retenção e recolhimento IRRF pela fonte pagadora quando a legislação assim exigir;
- Juros sobre os financiamentos necessários à operação da empresa, desde que concedidos por instituição financeira ou outra entidade autorizada a funcionar pelo BACEN, e
- Depreciação de equipamentos necessários à operação da empresa, no caso de atividade e industrial, observada a regulamentação sobre depreciação a que se sujeitam as pessoas jurídica submetidas ao regime do lucro real.
Vale destacar, ainda, a previsão que estabelece que a Receita Federal poderá fornecer os dados mencionados neste tópico e calcular o valor do redutor na Declaração Pré-preenchida do IRPF, a partir das informações prestadas pelas pessoas jurídicas pagadoras dos lucros e dividendos.
3. Tributação de Dividendos – Investidores Não Residentes no Brasil
Para além das alterações acima, aplicáveis aos beneficiários residentes no Brasil, o PL nº 1.085/2025 também previu a incidência de IR-Fonte, a alíquota de 10%, sobre os lucros ou dividendos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a beneficiários no exterior.
De forma semelhante ao que foi previsto em relação aos beneficiários residentes no país (que contam com o redutor do IRPFM devido, conforme item 2.1. acima), o PL nº 1.087/2025 trouxe a previsão de concessão de um crédito para os beneficiários residentes no exterior.
Neste sentido, caso se verifique que a soma da alíquota efetiva do IRPJ e CSLL da empresa pagadora dos lucros e dividendos com a alíquota de 10% seja superior ao percentual de tributação da pessoa jurídica mencionado anteriormente (i.e., 34% 40% ou 45%, conforme o caso), será concedido um crédito calculado sobre o montante de lucros e dividendos pagos que tenham se sujeitado ao IRF à alíquota de 10%. Este crédito poderá ser pleiteado pelo beneficiário no exterior no prazo de até 360 dias, contados do encerramento de cada exercício.
Não está claro na legislação proposta, no entanto, de que forma o crédito em questão poderá ser efetivamente utilizado pelo beneficiário. Do mesmo modo, a legislação deixa de lado temas relevantes, como por exemplo a forma de obtenção das informações necessárias para que os beneficiários possam pleitear tais créditos.
4. Considerações Finais
O texto apresentado do PL nº 1.087/2025 atende, de certa forma, ao anseio popular pela redução do IRPF para grande parte da classe média, ainda que crie algumas distorções em função da forma técnica adotada para esta alteração, sem a devida atualização da tabela progressiva vigente.
Por outro lado, muito embora possa a princípio ser “politicamente palatável”, a tributação de indivíduos de alta renda com um imposto de renda mínimo não previu a atualização dos valores de referência ao longo do tempo.
Em um cenário de inflação alta, é possível que se verifique com o passar dos anos os mesmos problemas já existentes p.ex. com a tabela progressiva (que se fosse corrigida regularmente pela inflação já teria previsão de isenção até mesmo para valores superiores a R$ 7.000,00/mês), bem como com as faixas de incidência do adicional de 10% do IRPJ (que nunca foram corrigidas).
Adicionalmente, a metodologia de cálculo prevista tanto para o redutor do IRPFM (aplicável aos beneficiários residentes no Brasil) quanto para o crédito do IRPFM (aplicável aos beneficiários no exterior) é extremamente complexa, e deverá causar muitas dúvidas aos contribuintes.
Nossa equipe está acompanhando atentamente a evolução das discussões sobre o assunto, bem como a tramitação do PL nº 1.087/2025 no Congresso Nacional, de forma que possamos avaliar os impactos das mudanças que certamente serão propostas ao texto.
Permanecemos à disposição para eventuais esclarecimentos e discussões sobre informações adicionais sobre o assunto.
Paulo H. G. Costa – paulo.costa@at.adv.br
Sócio Coordenador – Consultoria Tributária